Ex-funcionária é condenada a pagar mais de 15 mil reais à empresa após denunciar racismo

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Texto: Juca Guimarães Edição: Nataly Simões

A mestre em linguística Luanna Teófilo, formada pela Universidade de Sorbonne, na França, trabalhava como executiva comercial na multinacional PR Newswire, com sede nos Estados Unidos. Após ser vítima de racismo e denunciar o crime, ela foi condenada a pagar R$ 15.185,62 à empresa.

O crime aconteceu em 2016, quando a diretora geral da companhia, Thais Antoniolli, fez afirmações racistas e usou do cargo para constranger a funcionária, especificamente sobre suas tranças. A expressão “Tira Isso!” usada pela diretoria para discriminar a funcionária diante da equipe virou nome de uma página criada para denunciar casos de racismo corporativo. A página teve que sair do ar depois que a empresa processou Luanna e o Facebook.

Luanna foi demitida em outubro de 2016, em nota, após a repercussão da denúncia de racismo na rede social. A empresa disse, na época, que possui código de conduta e políticas internas para estabelecer “bom convívio no ambiente de trabalho” e ainda “dedicou todos os esforços para elucidar o episódio, que está totalmente esclarecido”.

Quase quatro anos depois e por ter sido processada pela empresa, a vítima, que é especialista em tecnologia na área de produtos, foi condenada na justiça trabalhista mesmo diante da pandemia da Covid-19, o novo coronavírus.

“Se em algum dia alguém ousar dizer que este país não é racista, não se esqueça que uma trabalhadora foi discriminada pelo seu cabelo e identidade preta, humilhada diante de seus colegas, escoltadas para fora de seu local do trabalho, processada três vezes por dizer a verdade e condenada a pagar uma indenização que certamente será contada como lucro pela empresa, afinal no Brasil racismo dá dinheiro”, escreveu Luanna, em sua conta no Facebook.

A ex-funcionária e vítima de racismo foi processada três vezes pela empresa e pela diretora geral da companhia; Uma no juízo cível, onde a ação foi julgada improcedente, e duas vezes na justiça do trabalho. A primeira reclamação foi considerada improcedente e a segunda condenou a trabalhadora em primeira e segunda instância.

“Mais importante que a minha condenação é o impacto dessa jurisprudência, que poderá ser usada contra qualquer trabalhador que denuncie o assédio e discriminação no trabalho”, considera Luanna.

‘Por se posicionar, você perde tudo’

A situação vivenciada por Luanna não é um caso isolado. A exemplo do caso do ginasta Angelo Assumpção, de 24 anos, que atuou pelo Esporte Clube Pinheiros, em São Paulo, durante 16 anos, construindo uma carreira vitoriosa, até ser demitido no final de 2019.

Assumpção foi desligado um mês antes do fim do contrato e após denunciar a rotina de racismo e discriminação vivenciada por ele dentro do clube desde 2015, quando fazia parte da seleção brasileira de ginástica.

“Não posso negar que vivi coisas maravilhosas dentro da seleção e do Pinheiros. Mas a sociedade não tem o letramento para lidar com o racismo. Ele é estrutural, está entranhado. De um dia para o outro, por se posicionar, você perde tudo. Todo mundo está empregado e eu não! Eu sou culpado por me posicionar sobre o que me machuca? Não dá para entender. A gente fica muito triste, porque não foi um caso isolado. Não foi a primeira vez”, afirmou o atleta, em entrevista à Folha de S. Paulo.

O ginasta foi hexacampeão pelo clube e teve depressão por conta do racismo e da reação da sociedade em silenciá-lo e culpá-lo por se posicionar a respeito do vídeo onde outros atletas faziam comentários racistas sobre ele.

“Aquilo é racismo, não é brincadeira. As pessoas não têm vergonha de cometer racismo. Elas têm vergonha de serem apanhadas. E se você toma uma atitude? ‘Quer ferrar a vida do cara’, ‘vai acabar com a carreira do cara?’, a gente escuta isso. E a minha? O racismo está acabando com a minha vida. E quem está preocupado?”, afirmou Assumpção. FONTE-YAHOO