Antes de decisão do STF, Bahia concedeu licença-maternidade à mãe não gestante em 2017

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Sete anos antes do Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecer que mães não gestantes em união homoafetiva poderiam ter licença-maternidade, a Bahia concedia o direito a uma funcionária pública de Itabuna, no Sul do estado. Isso aconteceu mais precisamente em 2017, quando, após uma luta na Justiça, a médica veterinária Lorena Machado, 51 anos, ganhou Agravo de Instrumento, com tutela antecipada para cumprimento imediato de uma licença de 180 dias.

Lorena é funcionária pública da Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia (Adab) há 21 anos, se reconheceu lésbica aos 23 e sempre teve o sonho de ser mãe. Após passar por cinco tentativas de gravidez por meio de Fertilização in Vitro (FIV), a médica veterinária e a então esposa, que preferiu não se identificar, tiveram o primeiro e único filho em 2016.

Na época, a esposa de Lorena era estudante da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e conseguiu receber os benefícios estudantis, mas nada pecuniário (relacionado a dinheiro). Meses antes do nascimento, ainda em 2016, Lorena solicitou licença-maternidade à Adab, que negou o pedido. Foi quando a médica reivindicou o direito à Procuradoria Geral do Estado (PGE), com a defesa da advogada Jurema Cintra.

“Dialoguei muito com o procurador para que tudo fosse resolvido administrativamente, mas não tivemos êxito, apenas respostas frias: ‘não tem previsão legal’”, explicou a advogada.

Lorena Machado reivindicava à Licença Natalidade, prevista no Artº 20, da Lei Estadual 6677/1994, aos servidores públicos do estado. A mãe gestante não tinha proteção previdenciária nem mesmo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pois não contribuía.

De acordo com Jurema Cintra, a complexidade está na questão da impossibilidade de duplo recebimento de um mesmo benefício. Com o Regime geral da Previdência Social, a licença é concedida por criança nascida. “Homens e mulheres têm períodos diferentes de afastamento do trabalho, com intuito de resguardar direitos da criança”, afirma. Mães servidores têm direito a 180 dias. No caso dos pais, o afastamento é de 20 dias, o que foi concedido à Lorena.

“Eu não sou pai, eu sou mãe. Só tive esse direito depois de dois anos e meio”, desabafa a médica veterinária. A vitória no tribunal aconteceu no final de dezembro de 2017, mas Lorena só teve o direito reconhecido em 2019. Os trâmites só ocorreram oficialmente em 2018. Com a burocracia interna, a decisão só foi efetiva em 2019.

A Adab recusou o pedido de Lorena, sob alegação de inexistência de legislação sobre o tema. Somente após o julgamento do recurso que o seu direito foi assegurado, segundo Jurema.

Os casos de Fertilização in Vitro são diferentes dos quadros de adoção. Em março de 2016, no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 778889, o STF já havia definido que mães adotantes teriam o mesmo direito das mães biológicas: licença de, no mínimo, 120 dias. Isso também partia o coração de Lorena. “Eu não teria problemas se tivesse adotado, mas como Marcelo era meu filho ‘legítimo’, eu fui em busca de meus direitos”, desabafa.